sexta-feira, agosto 29

Amarguras

Recebe-se às vezes uma confidência ou, com alusões veladas, alguém nos põe a par do seu sofrer. Em ocasiões assim não há conselho que sirva, e talvez esse alguém não deseje senão libertar-se de um peso. Reagir à desconhecida que ontem, sem razão que eu descubra, me mandou um longo mail de amarguras e decepções sentimentais, é ainda mais bicudo.
Quem me conhece sabe-o, de verdade não sou muito de poesia, mas num caso destes valho-me de Florbela Espanca (1894-1930).

A MULHER

Ó mulher! Como és fraca e como és forte!
Como sabes ser doce e desgraçada!
Como sabes fingir quando em teu peito
A tua alma se estorce amargurada!

Quantas morrem de saudosas duma imagem
Adorada que amaram doidamente!
Quantas e quantas endoidecem
Enquanto a boca ri alegremente!

Quanta paixão e amor às vezes têm
Sem nunca o confessarem a ninguém
Doces almas de dor e sofrimento!

Paixão que faria a felicidade
Dum rei; amor de sonho e de saudade,
Que se esvai e que foge num lamento!
(13.03.1916)