terça-feira, novembro 15

Cinquenta anos?

Má fama, boa fama, burguesia assim, povão assado, nobre, plebeu, burguês, comuna, talassa, vermelho, azul e branco, a necessidade de classificar, pertencer e distinguir, encontra-se tão instintivamente arreigada na  maioria que se lhe assemelha contra natura o proceder do que dispensa rótulos e prefere ir sozinho.
Sou desses. Mas a todos respeito, em meio nenhum me sinto deslocado, não olho de alto para ninguém, tão-pouco me dobro em vénias e genuflexões. Para ser eu próprio e dar-me o gosto de pelo meu pé descobrir o mundo e as várias gentes, antes de Sinatra cantar My Way, já eu ia à contra mão e contra corrente. Pagando o preço, que duma ou doutra maneira tudo tem o seu custo, mas satisfeito com o lucro que daí veio, pois junto ao que no mundo aflige, também muito nele me alegra e diverte.
Assim li eu esta manhã que um escritor famoso se preocupa com o que acontecerá aos seus livros dentro de cinquenta anos. Ia franzir o sobrolho, perguntando-me em que nuvem habita, porque cá em baixo não anda. Mas depois sorri, dizendo-me, bem-aventurado o que se põe num pedestal e se imagina nele ad vitam aeternam.
Mas cinquenta anos, colega? Talvez nem cinquenta meses, como acontece a melhor obra.