quinta-feira, abril 2

Cartas de amor

(Clique)

Neste tempo de sms, likes, emoticons, haverá ainda quem, com pena e papel, se sente a escrever cartas de amor?
Creio que o simples imaginar da cena causa hilaridade, para não falarmos do perigo que acarreta expor em frases que ficam – scripta manent – emoções e sentimentos que, exaltados por natureza, contêm o risco clássico do feitiço que se volta contra o feiticeiro.
Numa ou noutra altura, em estado febril, provavelmente quase todos nós, maiores de cinquenta anos, cometemos o erro de caligrafar em papel acessos de paixão, o mesmo é dizer que nesta e naquela gaveta, ou entre páginas de sonetos, se escondem umas quantas bombas de relógio. Não das que explodem em estilhaços e causam mortes, mas das que, como as do gás de mostarda,  discretamente espalham o seu veneno.
Imaginem-na, a esquecida namorada, irreconhecível, tão diferente da jovem que foi, e agora, num gesto de teatro, espalha sobre a mesa do café umas quantas folhas, em que não só reconhecemos a nossa letra, mas, bem pior, nos levam a recordar em detalhe quanto nos esforçámos, buscando-as no dicionário, por  encontrar palavras que, como um vidro de aumento, engrossassem a paixão.